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A poltrona 7: Mariinha era de uma beleza que não gritava, mas sussurrava

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Amin Safatle

Especial para o Jornal Opção

Mariinha tinha 15 anos, quando Aldair se apaixonou por ela. Menina alta para a idade, esbelta, dona de uma beleza que não gritava, mas sussurrava. Seus cabelos vermelhos, lisos, caídos até os ombros, balançavam como fogo derramado pelo vento. Sua pele clara, cor de jambo, levemente rosado tinha o tom de tardes ensolaradas, e o olhar era o que mais prendia. Por trás dos óculos de armação discreta, seus olhos brilhavam com uma inteligência calma e curiosa. Não usava maquiagem nem chamava a atenção com gestos. Mas havia nela um charme involuntário, quase distraído, como se a própria beleza não soubesse que estava ali.

Os óculos lhe davam um ar sério, às vezes, até distante. Mas quem a observava de verdade, e havia quem a observasse em silêncio, via que ali morava uma menina sonhadora, escondida atrás das lentes, esperando ser descoberta, como um segredo bem guardado.  

Aldair sonhava alto, com seu projeto de se tornar um engenheiro, construtor de futuros. Mas toda vez que ela passava, seu coração vacilava. Ela era leve, risonha, imprevisível. Ele? Silencioso, focado no seu projeto, orgulhoso demais para abrir o seu coração. Amava em segredo, como quem guarda um plano que ainda não pode ser executado. Acreditava que compromissos de um namoro firme atrapalhavam os sonhos, mas no fundo… Talvez ela fosse o único projeto que ele não sabia como começar.

Aldair a observava de longe, como quem estuda uma planta arquitetônica complexa, o som ritmado do lápis riscando o papel, cheio de curvas, detalhes e surpresas. E Mariinha não sabia do seu amor por ela, pois ele nunca tivera coragem de contar ao mundo o quanto ela era o dele.

Os dois se esbarravam nos ritos da igreja da Velha Matriz, nas procissões ao Morro de São João, nas arquibancadas dos circos, nos balanços dos parques de diversões e nas barracas da festa do Rosário. O silêncio só era interrompido pelos olhares furtivos ou mensagens enigmáticas dos correios elegantes.

Aldair era apaixonado por Mariinha, a ponto de pensar em trocar a Engenharia pela Medicina para tratá-la da visão. Mas era um projeto arriscado demais. “Não agora”, dizia a si mesmo. “Ainda não posso me distrair com um compromisso sério”. Erroneamente, ele pensava que amar era desviar-se da rota. Era abrir espaço num terreno onde cada centímetro já estava milimetricamente planejado.

Mariinha soube do amor que Aldair tinha por ela. Não porque ele tivesse dito, mas porque os olhares dele eram fáceis de traduzir.

– Ele não sabe, mas eu percebo o jeito como me olha sem olhar, como finge que está em outro mundo quando passo perto devagar. Ela também sabia escutar o que não era falado, especialmente vindo dos colegas dele.

– Ele gosta de você, Mariinha – diziam rindo –, mas não tem coragem nem de te olhar direito.

Mariinha também não dizia nada. Não por medo, mas por respeito. Entendia o silêncio dele. Sabia que, às vezes, o amor tem medo de nascer quando a vida está cheia de planos. No começo, ela não deu importância. Achou que era brincadeira boba de adolescente. Mas depois, começou a notar os detalhes do nervosismo quando ela passava por perto. 

Ela gostava de Aldair. Talvez não como nos filmes, com explosões e promessas eternas, mas gostava da gentileza quieta, da forma como ele parecia se importar, mesmo sem saber como demonstrar. E, no fundo, torcia para que, um dia, ele dissesse que a amava, que tropeçasse em palavras, sim, mas dissesse.

Certo dia, Mariinha confidenciou com sua amiga Valéria, do Colégio N. Sra. Mãe de Deus, o comportamento do Aldair:

– O rapaz finge que está em outro mundo quando passo perto, devagar. Seus amigos dizem que ele sonha alto, que vai longe. Que quer ser engenheiro para construir cidades, só que ele não entende é da existência de construções feitas de verdades. Verdades simples, como “gosto de você”, ou “quer sentar comigo no café?”. Ele some sempre que me aproximo, como se o amor fosse armadilha de mulher. Talvez ele me ache uma distração, um perigo, um desvio no caminho tão bem traçado. Mal sabe ele que o coração também é feito para ser projetado. E, se um dia ele voltar a me chamar, quem sabe ainda encontre o chão? Mas se demorar demais, pode ser que só encontre a recordação.

 Certo dia, Aldair voltou cansado de uma competição esportiva, mas com a alma leve. Sua equipe foi vitoriosa na partida de basquete com Goiandira, nada grandioso, mas foi uma vitória. Na volta para casa, foi ao Cine Real assistir ao filme Gigi, um musical romântico, com Leslie Caron e Maurice Chevalier. Dentro da sala, o escurinho já havia começado. A lanterninha, com luz tímida e o rosto entediado, apontou para uma poltrona vaga no meio da fileira. Aldair foi andando com cuidado, tropeçando em pés alheios e pedidos de desculpa abafados.

Só quando se acomodou no seu assento, que percebeu a grande surpresa. Ao seu lado, os cabelos vermelhos refletiam o brilho da tela. Os óculos, a postura serena. Mariinha estava ali. Tão perto, tão inesperada, tão real. Não disse nada. Nem ela. Mas ao ajeitar-se na poltrona, seu braço encostou-se ao braço dela. Um toque breve. Mas nenhum dos dois afastou.

Os olhos se encontraram de relance e, naquele breve toque de pele, havia mais do que simples proximidade: eram desejos contidos, lembranças não vividas, promessas mudas. O mundo ao redor pareceu desacelerar, como se tudo esperasse pelo que viria daquele instante.

– Desculpa, murmurou Aldair com voz rouca – mas ele não se afastou.

Mariinha sorriu ao lado, tímida, mas não recuou também. O calor do toque ainda vibrava em seu braço como um segredo só deles.

Ficaram assim, braços encostados, pele com pele, corações acelerados, enquanto a música do filme preenchia o ar. Na tela, personagens se declaravam com canções. Na fileira 5, poltrona 7, um silêncio dizia tudo o que as palavras não haviam conseguido dizer nos últimos dois anos. 

A vida com sua pressa silenciosa levou Aldair por caminhos diferentes. Ele partiu na semana seguinte, com uma mala pequena e um coração cheio de perguntas. Mariinha ficou como quem espera sem admitir, ocupando os dias com rotina e silêncios prolongados, tentando não olhar para o banco da praça onde tudo quase aconteceu.

Nenhum bilhete, nenhuma carta. Só a memória daquele toque breve, mas inesquecível.

Aldair, em noites longas e solitárias de cidade grande, lembrava-se do cheiro do vento no cabelo dela, do calor do braço que tocou o seu. E Mariinha, entre o café coado pela manhã e o olhar perdido na varanda, às vezes sentia que ele estava ali, na lembrança de um quase amor que a vida não deixou florescer.

E, assim, seguiram separados pelo tempo e pelas escolhas, mas ligados por um instante que nunca se repetiu. Um amor que nasceu no silêncio e morreu sem nunca ser dito em voz alta.

Amin Safatle é cronista.

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