Tradução da Constituição para língua indígena foi missão conferida ao presidente da Biblioteca Nacional
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Marco Lucchesi falou à TV 247 da missão que recebeu da ministra Rosa Weber para coordenar a versão em nheengatu da Carta brasileira
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Regina Zappa do 247 - No dia 19 de julho, o presidente da Biblioteca Nacional, Marco Lucchesi, acompanhou a ministra do STF, Rosa Weber, até São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas, para um feito histórico. Pela primeira vez na história da nossa República foi lançada a versão da Constituição Federal brasileira em língua indígena, o nheengatu, língua de origem tupinambá falada por diversos povos que vivem na região amazônica.Lucchesi, premiado poeta, escritor, romancista, ensaísta, tradutor, historiador e esperantista brasileiro, professor titular da Faculdade de Letras da Universidade Federal do Rio de Janeiro, foi quem coordenou a tradução para o idioma tupinambá, ao lado de mais 15 tradutores do Conselho Nacional de Justiça. O escritor domina mais de 20 idiomas, é autor de mais de 50 livros, entre poesia, ensaio e romance, e ocupa a cadeira de número 15 da Academia Brasileira de Letras (ABL), instituição que presidiu entre 2018 e 2021, sendo o mais jovem imortal na época da sua eleição.Em entrevista à TV 247, Lucchesi contou como foi sua recente visita ao Vale do Javari com a ministra Rosa Weber, quando ouviu a sugestão da ministra sobre a tradução. A visita à região amazônica, onde foram assassinados Bruno Pereira e Dom Phillips, foi para ele “uma experiência eminentemente hidráulica para os olhos”, de tanta emoção. “Naquele momento eu só tinha lágrimas. Chorei muito ao ver a fragilidade dos povos originários daquele região, inclusive alguns de contato recente.”Foi nessa viagem que a ministra Rosa Weber contou a Lucchesi sua determinação em traduzir a Constituição, que ela ama, para uma língua originária e perguntou a ele qual deveria ser. Ele sugeriu que agora fosse o nheengatu. “Foi um trabalho intenso e complexo.” Às vezes, conta Lucchesi, algum tradutor perguntava: o que é imposto? Como traduzir essa palavra?“Além do fato da ministra do STF ter ido lá, sendo recebida pelos índios com seu nome indígena, Raminah Kanamari, [a tradução] é um ato simbólico importante, que, além de fortalecer essa língua e o direito dos povos originários, significa também fortalecer as potências poéticas e de cidadania desses povos.”Lucchesi tem se dedicado ao estudo dos idiomas e tradições orais originárias do Brasil. Tem visitado comunidades, como as aldeias Pará e outras amazônicas. “Sou um estudante de nheengatu, língua que frequento por amor e curiosidade, mas não com a disciplina de um Navarro. Pesquiso esses idiomas há tempos. São mais de 275 línguas praticadas no país, que não é, como dizem, monoglota. É um país plurilingue.”Lucchesi, que assumiu há pouco a presidência da Biblioteca Nacional, uma das 10 maiores bibliotecas do mundo, segundo a UNESCO, foi o primeiro a recusar, no governo passado, a indicação à Medalha de Ordem do Mérito ao Livro da BN, assim que soube que Daniel Silveira e outros bolsonaristas também estavam indicados. No entanto, ele não acha que a instituição tenha sofrido desmonte análogo ao de muitas outras e que de um modo geral ficou preservada. Acredita que isso se deu graças à qualidade de seus funcionários, “que sabem da missão importante que lhes compete”. “Esses últimos seis anos foram muito difíceis para todos nós, brasileiros, cuja cidadania sofreu de uma insalubridade cívica. Foi uma travessia muito pesada.”Lucchesi estava na Itália, fazendo pesquisa, quando recebeu um telefonema da ministra Margareth Menezes com o convite para assumir a presidência da BN e se revestiu da missão, como ele mesmo disse. “Não podia resistir à sedução de dirigir uma casa como essa, paixão que cultivo desde que comecei a frequentar aos 15 anos. Tenho um amor edipiano, um amor materno pela Biblioteca na perspectiva cidadã e republicana.”E elogiou a ministra. “Margareth Menezes é uma ministra que se joga. Ela lançou toda a sua biografia no sistema MinC e se coloca à disposição da sociedade civil brasileira para fortalecer a cultura. Pela primeira vez tivemos um aporte de 30 milhões para preservação e restauro da Biblioteca Nacional.”Lucchesi contou ainda que frequentou muito os cárceres brasileiros, levando livros e ouvindo a população carcerária quando estava à frente da ABL e contribuía com o diálogo com o Conselho Nacional de Justiça. Lançou o Prêmio Akuli para trabalhos voltados para o registro das tradições orais originárias, quilombolas e ribeirinhas. Anunciou um "braço" da Biblioteca Nacional na Antártica, “um espaço nosso dentro da base brasileira, com livros que são publicações da BN”. É essa voz humanista e republicana que podemos ouvir, com mais detalhes, na íntegra da entrevista que concedeu ao 247.